REGRAS PUNEM CLIENTE QUE DESISTIR DE IMÓVEL

Prédio em obras em Vitória: nova lei vai estabelecer
normas rígidas para aquisição de imóvel na planta

Autor: Mikaella Campos 

Consumidores tentam barrar lei que aumenta multa rescisória


A profunda recessão brasileira tem inflamado o conflito entre construtoras e clientes. Enquanto as empresas buscam aprovar no Congresso Nacional punições mais severas àqueles que desistem de um imóvel comprado na planta, a ala que defende o direito dos consumidores tenta afrouxar as regras, estabelecendo uma multa mais branda .
O impasse está em torno da proposta do senador Romero Jucá. A princípio, o projeto de lei 774/2015 prevê a retenção de até 25% do valor pago pelo cliente, mais 5% da comissão de corretagem e ainda dá aval para as incorporadoras cobrarem outros possíveis prejuízos com o rompimento do contrato.
A matéria também é polêmica por não tratar de forma diferenciada os tipos de rescisões, permitindo penalidades inclusive para quem rompe o acordo por causa do atraso das obras.
O ressarcimento do valor pago pelo comprador é outro ponto sensível. A lei em construção permite a construtora realizar o reembolso um ano depois e ainda parcelado em três vezes.
O teor do projeto é uma reivindicação do setor da construção civil, que afirma estar com as finanças comprometidas diante do grande volume de devoluções ocorridas desde quando a crise econômica brasileira veio à tona.
O advogado especializado em Defesa do Consumidor Igor Britto explica que o projeto está tramitando de forma acelerada no Senado. “Tanto o governo federal quanto o Congresso falam na necessidade de salvar as construtoras, de promover um reaquecimento do mercado. O problema é que a proposta trata todos os consumidores da mesma forma. É importante separar o joio do trigo”, analisa.
Segundo Britto, se a desistência é por culpa do consumidor, faz sentido a aplicação de multas de até 25% do que foi pago, limite já pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Mas se o contrato é rompido por causa do não cumprimento do prazo da entrega, caberia a construtora indenizar o consumidor. “Em todo o país, estima-se que mais de 25 mil famílias aguardam a entrega de imóveis com obras atrasadas”.
Consumidores
Um parecer contrário ao projeto do Romero Jucá foi apresentado pelo relator do projeto, o senador Benedito Lira, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, fixando a multa para os desistentes em no máximo 10% do valor pago.
Ele afirma que reembolso parcelado e um ano depois contrariam a Súmula 543, do STJ, que define a devolução do dinheiro ao consumidor de imediato. Segundo ele, é dever da empresa ter recursos para concluir a obra mesmo sem a venda das unidades. As empresas não podem condicionar a conclusão das obras ao fluxo financeiro das comercializações. Na análise, o parlamentar afirma que dentro da multa cobrada já está incluída a taxa de corretagem. O texto ainda não foi votado e será reavaliado por Lira.
“A multa definida pelo relator não é capaz de arcar com os custos da construtora. Muitas vezes, o consumidor desiste logo no início da obra, sendo 10% aplicado em cima do volume pago um percentual extremamente baixo. É uma ideia que não fecha com a realidade econômica”, afirma o advogado, Carlos Augusto da Motta Leal, que representa o Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon).
Na visão dele, o parecer do relator inviabiliza o projeto de lei e traz mais insegurança jurídica ao setor. “Se for aprovado com essas mudanças, a lei vai desestimular a construção civil em novos lançamentos. O consumidor precisa entender que imóvel é um bem durável. Não é a mesma coisa de se comprar um freezer ou uma geladeira.”
O que está em discussão
O que propõe o projeto de lei de Romero Jucá
Multa
O projeto de lei 774/2015, em seu formato inicial, estabelece uma multa de até 25% do valor do imóvel para qualquer consumidor que desistir do imóvel comprado na planta mesmo para aqueles que solicitaram a rescisão devido ao atraso nas obras.
Prazo da devolução
O projeto dá 12 meses para a empresa reembolsar o cliente após a formalização do distrato. O pagamento pode ser parcelado em até três vezes.
Outras punições
O projeto ainda permite o aumento da multa quando a construtora conseguir provar os prejuízos que teve com o rompimento do contrato. Para conseguir fazer essa cobrança a mais, segundo a proposta, a empresa deve prever essa penalidade em contrato.
Comissão de corretagem
O projeto permite a retenção de 5% do valor do imóvel pago a título de corretagem. As empresas também podem cobrar pelos impostos recolhidos.
O que propõe o relator
Multa
O relator incorporou ao seu parecer, emenda proposta pela senadora Marta Suplicy, que estabelece multa de 10% do valor pago pelo consumidor em caso de desistência. O percentual não pode ser aplicado em casos de rompimento do contrato por culpa da construtora, ou seja, quando há atraso nas obras.
Comissão de corretagem
O relator entende que a comissão está integrada na multa, não sendo possível aumentar o percentual retido pela construtora.
O que diz o Superior Tribunal de Justiça (STJ)
Multa
Para o STJ, na Súmula 543, estabelece que a devolução do dinheiro tem que ser imediata. As empresas podem reter entre 10% a 25% do valor pago pelo cliente que desistir do imóvel.
Atrasos são responsáveis por desistências
Mesmo com a crise econômica e o aumento do desemprego, o atraso nas obras é ainda um dos principais motivos que levam muitos consumidores a voltar atrás na compra de um imóvel.
O rompimento do contrato, apesar da existência de regras especificando o percentual que pode ser retido pelas empresas, continua a ser um tema discutido na Justiça.
Segundo o advogado especializado em Direito do Consumidor, Rafael Pirola, somente contra três construtoras, as maiores que atuam no Estado, tramitam mais de mil ações individuais e coletivas.
Ele explica que mesmo quando o cliente decide cancelar o contrato devido ao atraso na entrega do imóvel, as empresas dificultam o ressarcimento. “Quando a culpa é da construtora, o consumidor tem direito de receber de volta tudo que pagou”, afirma, ao ressaltar ainda que o cliente, ao decidir pela compra do imóvel, leva em consideração o tempo de duração da obra. “Muitas empresas prometem a conclusão num prazo inferior ao necessário para atrair o cliente e acaba não conseguindo cumprir. Isso gera vários prejuízos aos consumidores, principalmente aqueles que moram de aluguel”.
Pacto
O percentual da multa tem sido alvo de uma série de discussões desde o início do ano quando construtoras e o governo federal assinaram o “pacto global” da construção civil, deixando as corporações aplicarem multa de até 10% do valor do imóvel em casos de rescisão. O acordo caiu após o Ministério Público de Defesa do Consumidor (MPCON) e os Procons se recusarem a assinar o documento.
Para derrubar os entraves, uma nova negociação com as empresas foi iniciada pelo MPCON para o estabelecimento de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Mas, as conversas não avançaram. Semana passada, a associação, que une as Promotorias de Defesa do Consumidor de todo o país, e a Defensoria Pública desistiram de formalizar qualquer tipo de conciliação.
“Não teve consenso. As empresas só aceitaram fazer acordo se houvesse a aplicação da multa rescisória vinculada ao valor total do imóvel. Já o MPCON entendia que poderíamos estabelecer um penalidade desde que ela fosse de no máximo 25% do valor pago pelo consumidor”, explica a promotora de Justiça e vice-presidente do MPCON, Sandra Lengruber.
O prazo de tolerância foi outro tema que causou divergência. Hoje, as empresas entendem que, em situações de atraso nas obras, só depois de 180 dias após a data estipulada para a entrega dos imóveis devem pagar ao consumidor indenizações.


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